sexta-feira, 14 de maio de 2010

Inclinação


Vontade de olhar para trás, limpar os restos de cada revés, olhar no olho do passado e gastar os resquícios daquelas lembranças. Só assim para esquecer o absurdo, a mente congelada no que antes parecia ser o abismo dos sentidos. Sentar na beira da estrada e esperar o ônibus do próximo instante carregar todos os beijos de amor e ódio para bem longe, onde só se acumulam lixões de sonhos abortados. Mas aí vem o desejo do retorno, as marcas que se entranham na pele adentro, as cicatrizes do que se viveu sem saber por quê. Dança das ilusões surgindo na esquina da mente, apontando para uma tristeza infinda. E segue a busca pelo momento do que ainda vai chegar, já que é pra frente que se inclina. Festa das flores: andar cheio de claricices nesta caminhada.


Imagem: Quadro 'Persistência da Memória', de Salvador Dali

Um comentário:

Fátima Lima disse...

Lara, sou sua leitora e fã. Tem uma propriedade subjetiva em sua escrita que me fascina. Este, por exemplo, é tão profundo, tão doído e tão esperançoso (Festa das flores: andar cheio de claricices nesta caminhada). Mas também gostaria de falar sobre a série de pinturas de dali denominada “relógios moles”. Dali almoçava com Gala (sua esposa) e alguns amigos. Era um dia muito quente. Gala e os amigos vão ao cinema. Dali olha para o queijo em cima da mesa. O calor o deixara amolecido. Dali enfia o dedo no queijo, sente sua textura, sente seu amolecido e pensa “a subjetividade é assim”, “os nossos interiores são assim”. Dali levanta, vai para o seu atelier e duas horas depois sai a primeira obra da série “relógios moles”. É isso.... Nós, nossos relógios moles e a capacidade inventiva daliniana. Abs e um bom final de semana