sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Ménage à Trois


Mais uma vez, começo a análise minúscula de uma narrativa contando como a obra chegou até as minhas mãos. Gosto dessa relação inicial de encontro entre livro e leitor: parece amor à primeira vista, tesão às primeiras folheadas. No meio dos livrinhos da L&PM Pocket, catando coisas inusitadas, me deparo com o título “Ménage à Trois” e ainda uma capa belíssima, em tons de rosa e vermelho. Logo abaixo do título, à direita, aparece “Eu versos eu / sem vergonha / mundo da lua / e outros poemas”. Olhei o conteúdo rapidamente e, sim, me apaixonei. Adoro essas descobertas literárias, solitárias e simbólicas.

Pesquisando sobre a história do livro, descubro que ele é composto dos três primeiros livros da escritora Paula Taitelbaum, desta vez todos reunidos em um só volume da coleção L&PM. Publicado em 2006, o livro revela um misto de angústia, erotismo, sensibilidade, ritmo, musicalidade, enfim, poemas diluídos em sentimentos e sensações. A obra toca lá dentro, onde só nós alcançamos quando estamos em estado de extremo ópio existencial.

Os poemas gozam de um senso de humor escrachado, delicioso: “Abre as pernas / E fecha os olhos!”. Outras vezes nos faz pensar em coisas simples que dizem muito: “Eu mando você tomar banho / Eu lavo a alma”. Já em outros casos, aparece um poema duro, sem alívio: “Demito minha paixão da coerência / E sem qualquer aviso prévio / Levo meu corpo à falência”. Ainda dentro do erotismo vulgar e sarcástico, encontramos: “Esse infeliz só me vê como uma boceta / Porque no lugar de neurônios / Ele tem gametas”.

Acompanhe abaixo um poema:

Um dia
Você se dá conta

Que a paixão
Não vem pronta
Nem fica tonta
Por tanto tempo
Os modos

Mudam
Os medos

Nos fazem mudos

E o que era tudo

Torna-se agora médio
Que remédio...
Senão matar esse pavor
Com um amor
Maior que o tédio

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Eu sei que sou


Eu rasgo pensamentos como quem desfia um tecido estridentemente, primeiro cortando com a tesoura a primeira brecha de ideias. Forço palavras que não são minhas, só para me salvar. Danço conforme a melodia, numa espécie de samba do bem viver. Desperdiço fantasias, glórias e vantagens. Vivo no submundo dos sentimentos. E de lá não sei se quero sair. Ou se saberia sair. Ando caindo ou caio andando toda vez que sinto meus dentes trincarem de prazer ou de dor. Sou efêmera, voraz e latente. Vou de um lado a outro da história sem ninguém perceber. Garanto coragem e inovação, mas só para fora. Por dentro, ai ai, sou doce de leite derretido em chapa quente, sou o avesso do sal, a seca da felicidade. Um dia saio mato afora pra ver se me acho mato adentro. Ou então mato.

domingo, 23 de janeiro de 2011

Liberdade submersa


Cheiro leve, distante, confuso da libertação. Onde se esconde essa pequena-grande festa do espírito? Em que mentes livres deve atuar esse sistema que desaprega amarras, manifesta a plenitude do ser e ainda abre os braços para mostrar ao mundo seu potencial? Deve morar no mundo das não-explicações, onde só os mistérios podem pousar e agraciar com seu colorido envolto no véu da surpresa. Só lá é que a vida guarda seus segredos e faz teatro com os nossos corpos agitados numa rede de ligações sem solução. Precisamos ser resgatados do fundo de nós mesmos: vir à tona, transbordar e dar o tom das próprias limitações. Só assim a leveza fará parte da nossa existência, o céu se tornará mais claro e o chão será mais seguro. Andemos, pois!

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Convulsão


Já sonhei com flores azuis que me diziam para não esquecer o futuro, porque é a partir dele que surgirá o pingo amarelo que reluzirá o meu chão. Como alguém que segura uma lanterna natural, a vida se abrirá perfeita e ensolarada, dizendo sim aos momentos, às angústias e às alegrias. Porque o que interessa é a aceitação do que existe, do que está agora, aqui dentro, fazendo chocar sonhos com realidade. Enquanto o senhor do tempo não apressa as horas, fico aqui a me debruçar sobre o presente, olhando para o que está em volta, para o vazio desse instante tão pueril. Segundos me tomam o ar, secam a minha garganta, reviram o meu estômago. Entro em convulsão de mim mesma. Sou, agora, língua enrolada de desejos. Por favor, tragam meu Gardenal. Chega de epilepsia emocional.