quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Fluir

O vento...
esse salvador
das horas cruéis
dos momentos ingratos,
das passagens intermináveis,
da folha que não quer
sair do lugar.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Poeira de amor

Virei poeira de amor: resto da asa de uma borboleta embaixo da cadeira. Virei papel amassado, descartado, sem limpidez e graça. Gosto de me sentir segura. Mas quem se importa? Só...sempre só de mim. Para onde partir, se em todo lugar me encontro cada vez mais fragmentada? Uma metade de mim para mim. Pólen borrado, de um amarelo turvo desbotado. Nem sei de qual ponte irei me jogar para encontrar o vento que me arrastou. Uma mão impossível me tiraria desse nojento canto de desprezados.
Onde deixei meu sangue viril, minha voz grave gritando coragem, meu texto anti-regras? Vou buscar a essência que foi exposta na parede das lamentações e abraçar as dores para que elas se sintam menores e se esfacelem aqui dentro. E sonho mais: a cabeça voltada para cima, a chuva de choro contemplativo para trazer o alívio de uma proteção aguardada e justificável. Quero esquecer o desejo no bueiro da primeira esquina fétida da minha cidade orgânica.


Lara Aguiar

Uma pessoa...

Que saudade do Fernando, o Pessoa. É hora de dar continuidade à minha bíblia da literatura, "O livro do desassossego", o qual sempre paro no meio do caminho, no sentido de economizar leituras para o futuro. É uma vontade de que existam textos como esses durante toda a minha vida... Dispensa maiores considerações...

Vou chamar de pág. 123, versículo 93:

Em mim foi sempre menor a intensidade das sensações que a intensidade da consciência delas. Sofri sempre mais com a consciência de estar sofrendo que com o sofrimento de que tinha consciência.
A vida das minhas emoções mudou-se, de origem, para as salas do pensamento, e ali vivi sempre mais amplamente o conhecimento emotivo da vida.
E como o pensamento, quando alberga a emoção, se torna mais exigente que ela, o regime de consciência, em que passei a viver o que sentia, tornava-me mais quotidiana, mais epidérmica, mais cintilante a maneira como sentia.
Criei-me eco e abismo, pensando. Multipliquei-me aprofundando-me.

domingo, 20 de setembro de 2009

Poema Moseiano

A pedidos, mais um de Viviane Mosé:


Queria escrever todas as plantas e pessoas, todos os rios.
Os muros, as cores, os homens.
As senhoras de idade, as caixas de correio, os espanhóis.
Os olhos e as ruas, os tamanhos e larguras, as alturas.
As pernas, os falos, os pêlos, os pulsos.

Queria escrever o ritmo das pedras, das estradas calçadas.
Das margaridas. Escrever o que manda e o que obedece.
O que cresce e o que padece de amparo. O que afunda,
O que eclode. Escrever o que não sabe e o que não cabe
Em lugar nenhum.

E viver a escrita das coisas. Não as coisas
Que não me cabem. Coisas e pessoas não me cabem
E sem cabimento me atravessam.
Pessoas passam depressa demais entre meus poros. E vão.
Eu tenho uma imagem presa na garganta.
Ser gente me arranha. Quero voltar a ser palavra

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Vontade de vida


No poema abaixo, Viviane Mosé parece descrever o fim querendo aprisionar mais uma vítima. A morte querendo chegar, os sintomas se aproximam, nada muito claro, mas o narrador nega essa realidade até a última gota. É a vontade de vida pulsando mais forte.


Não é uma gripe, um joelho ralado.
Não é garganta inflamada.
Nem piolho.
Não é sinusite, otite, cansaço.
Não é o que passa com antibiótico, analgésico.
Picada de inseto, bicho-de-pé, dor de cabeça não é.
É um desacerto, um desconforto, um desatino, uma dispersão.
A terra chama alguém pro chão.
Mas eu não, eu não.
Ainda não sei morrer.
Ainda não sei não.

Viviane Mosé

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Ouro na poesia


Durante esta semana postarei alguns poemas da minha mais nova descoberta. Adoro me fantasiar de garimpeira e achar ouros tão refinados como o livro "Pensamento chão", de Viviane Mosé, com uma poesia tão leminskiana, doce, onde a palavra é o maior triunfo que pode existir. Viviane parece que caminha lado a lado a Manoel de Barros, outro poeta dos pormenores, do indizível, das brincadeiras com a linguagem. E é esse susto a cada verso o que faz tremer o leitor com sede de textos cada vez mais ricos, densos, curtos, plurais e metafóricos. É tudo poema-poesia em si.


Tem gente que tem o costume de vazar pelos cantos.
No começo vaza calada. Aos poucos. Aos pingos.
Mas se pega gosto principia o derrame.
Escorre quando fala. Escorre quando anda.
Não tem mais braço nem cabelo que segure.
Parece que vicia em ficar transbordada.

Mas tem gente que quando transborda é pra dentro.
E corre o risco de ficar represada. E represa você sabe.
Se aumenta muito arrebenta.

Mas se a pessoa ensaia um jeito de derramar pra fora.
Aí vai fazendo leito. Vai abrindo seu caminho na terra.
E a terra parece que se abre pra ela passar. Às vezes não.

Viviane Mosé

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Poeminha de Cecília

Trechinhos do poema "Mulher no espelho", de Cecília Meireles:

...
Que mal faz, esta cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se tudo é tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?
...
Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Bienal do Livro em PE

Está chegando a feira de livros mais importante do Nordeste. Entre os dia 2 e 12 de outubro, com o tema “Literatura do princípio ao fim”, será realizada a Bienal Internacional do Livro de Pernambuco. A 7ª edição acontece no pavilhão de exposições do Centro de Convenções de Pernambuco, em Olinda (PE).
A bienal é considerada a 3ª maior do Brasil, atrás apenas do Rio e São Paulo. Desta vez, o Rio Grande do Sul é o estado homenageado. Por isso, durante o período da feira, os organizadores esperam receber mais de 500 mil pessoas.
A programação promete oficinas literárias, apresentações teatrais, interpretação textual, palestras, debates, entrevistas e bate-papos acerca das produções literárias. A ideia é apresentar livros que não são achados na maioria das livrarias. E sempre com o cuidado de viabilizar estas ofertas com preços acessíveis.
Mais informações no link abaixo:
http://www.bienalpernambuco.com/

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Pulsão de fogo


Vontade de sentir vida, pulsão de coisas e fogo, até escancarar o impulso do sangue nas veias. Quero viver a dormência da pressa, a anestesia do tempo escasso, a letargia dos dias rotineiros. Esses momentos de inconformação sou eu. E ainda caibo dentro das horas de angústia. Mas precisamos da queda em cada mudança de estação para conseguir enxergar o prazer da tarefa batida e esperada. Isso porque o ócio tem limites e não socorre mais depois de poucos dias e noites. Fome da inconsciência da ocupação que nos faz mais dignos e saudáveis. Sede de coragem para entrar na guerra ou na selva. Agora, só o levantar importa.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Quant à moi, je vous offre mon visage au vent

A frase abaixo me acompanha há muito tempo...

Quanto a mim, ofereço meu rosto ao vento.
(Clarice Lispector)

Sem exigência do diploma, faculdades fecham cursos de Jornalismo

Todo mundo já sabia. Depois do fim da exigência do diploma, faculdades de todo o país iriam acabar fechando o curso de Jornalismo. Foi o que fez a Faculdade de Campinas (Facamp), que não abriu novas vagas para a carreira no vestibular 2010.
O mais incrível disso tudo é que a graduação de Jornalismo nesta universidade obteve conceito 5 no Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes) em 2006, o mais alto dado pelo Ministério da Educação.
Também... Com uma mensalidade de R$ 2.000, neste caso da Facamp, quem vai querer pagar tão caro por um diploma que não é mais exigido para o exercício da função?