sexta-feira, 26 de outubro de 2012
Lá maior
Eu queria ser uma música, daquelas que deliram por si, que também são absorvidas pelos poros, entram na veia da realidade e transformam a seca em água de sentimentos. Inundação de ilusões à beira de derramar, gostosa, silente e intensa. É nessa lagoa que quero descansar meu corpo, refugiar os meus mais belos olhares e manter uma harmonia dos sentidos. Prefiro deixar entrar essa vibração aguada, latente e pulsante, à qual me entrego e me deleito sem pestanejar, deixando a vida se colorir e o ar dançar entre as nuvens do pensamento. Estou solta, leve, lilás, deitada na luz que me esquenta e me carrega para o horizonte mais bonito, aquele em que as montanhas parecem uma sombra escondendo o sol a se por, dizendo pra chegar mais perto, se aproximar, gastar os passos pra cantar pra o alto. E quando a nota chegar nas nuvens, todo o céu vai se espraiar, derramar gotas de sonhos e ferver coragem. Verei de perto esta sangria harmônica percorrendo os tendões do mundo.
Foto: Lara Aguiar
domingo, 30 de setembro de 2012
Vai e não volta
Constância de sonhos, desmembramento de construções, olhar
perdido na infinidade de possibilidades. O nada se prontifica, faz instalação
em peito farto de tiros ao vento. E o cheio se aproveita para descansar
enquanto não é chegada a hora de abastecer a vida com galanteios da música,
floreios de amor e quedas menos bruscas. Já que o tombo existe, que seja apenas
de raspão. A arma já está apontada para a cabeça e as ilusões não demonstram
nem interesse em permanecer. Só o real agoniza, força a dor e desencanta até os
mais lúcidos, calejando o que é de dentro e feito para ser intenso. Quanto mais
se justifica o silêncio dessa agonia, mais ela se expande, ganha dimensões nada
coloridas e flerta com a decadência. Sobreviver ao caos é preciso. E mais
necessário ainda é ver o amanhecer ouvindo os violinos da vida pulsando e
chamando para o combate. Assim a crença se volta para a necessidade do olhar infinito
em busca da primeira dança de sorrisos a bailar pelo corpo.
Foto: Lara Aguiar
- Obra de arte exposta no Museo de Arte Latinoamericano de Buenos Aires
segunda-feira, 2 de julho de 2012
Teias de uma história
Desencontros, desamores,
destemperos. Todos numa só construção de teias entre vidas que se cruzam em
momentos distintos, cada um com suas verdades. O livro de Claudia Tajes, “Dores,
amores & assemelhados”, traz um festival de desilusões, ilusões, pura vida
amorosa em cada página. Esse cotidiano de coisas é o que move as personagens Júlia
e Jonas num desenrolar sem fim.
Como o livro é dividido
em partes, contando a mesma história só que em versões diferentes, pelos
ângulos de visão dos dois personagens, a cada página virada é uma surpresa ver
o pensamento de um e de outro sobre uma mesma situação. Como pensa o homem e
como pensa uma mulher? Aí já entra num viés que trata de gêneros e então é
melhor ficar por aqui.
O que importa é que a
história prende o leitor, como se dissesse: devora-me ou te devorarei de
curiosidade. Além disso, Tajes brinca com o não-dito, com as entrelinhas, com o
texto fluido e rico de composições peroladas. Verdadeiras sentenças da
existência com seus entrecruzamentos sendo relatados por Tajes, o que torna o
conteúdo um tanto delicioso e excêntrico.
O humor é presença
marcante nos textos de Claudia Tajes. Contagia devido à naturalidade com que as
coisas são contadas, expressas, sentidas. Júlia e Jonas vivem uma história
paralela, mas cheia de nuances interessantes. Enquanto isso, o leitor aprecia a
vida dos dois como se estivesse olhando pela janela da vizinha fofoqueira. O
final? Ah... Isso, só lendo. Leitura mais que recomendada.
Segue um trechinho abaixo:
"Supondo que a maioria das pessoas saiba como funcionam essas coisas, digo apenas que tomei muito cuidado para não passar nem perto da cavidade onde um dia houve um siso. Quarta-feira, na terapia, eu discutiria longamente a minha necessidade de manter uma imagem sexualmente agressiva, mesmo após uma cirurgia dentária".
Segue um trechinho abaixo:
"Supondo que a maioria das pessoas saiba como funcionam essas coisas, digo apenas que tomei muito cuidado para não passar nem perto da cavidade onde um dia houve um siso. Quarta-feira, na terapia, eu discutiria longamente a minha necessidade de manter uma imagem sexualmente agressiva, mesmo após uma cirurgia dentária".
sexta-feira, 22 de junho de 2012
Sem tarjas
Longe da fúria das pontiagudas navalhas e dos sacos imóveis de cimento estacionados nos becos, uma fina lâmina de marcas de expressão conquista o presente. Ela se movimenta em círculos, em vai-e-vens desenfreados, em doces fórmulas incompreensíveis ao olho humano. Soterra confusões semiabertas, corrói o ferro do que é triste e coça forte a garganta das possibilidades. Já vestiu a pura roupa onde só os vestígios fervem de calor certeiro e indolor. A loucura também passeou por essa obra em construção, com botas de cano curto, pisando brejeira e sensual num chão íngreme e escorregadio. Depois, ainda levou o vento pra passear, soprando levemente o vestido que um dia cobriu a escuridão de um tempo vazio e delicado. Ela dançou a vida das tarjas, um dia pretas, outro dia vermelhas, e agora canta um som valoroso, seguro, firme e desafiador. Nesse caos invernoso, surge um sol de caê.
quarta-feira, 20 de junho de 2012
Noite em claro pode ser insônia boa
Martha Medeiros, te amo!
E lá vou eu de novo com ela, grande amor, mas não único. E não é que a editora L&PM Pocket lançou no final de maio um livro de Martha? Sem muito estardalhaço, esse veio quietinho, mas veio intenso, arrebatador. É uma espécie de novela e que se encaixou na 'Coleção 64 páginas' da editora, com preço fixo de R$ 5,00. O título? Sugestivo e veio bem a calhar nesses tempos de insônia coletiva: "Noite em claro".
Se você for um leitor ávido, acho que dá pra ler em uns 15 ou 20 minutinhos. O texto é rápido, não trava e ainda oferece umas risadas solitárias, principalmente diante de frases inesperadas no meio da narrativa. Nesta obra, Martha insere uma ousadia: em uma página, conta a história que ocupa apenas metade da folha; em outra página, apenas uma frase ou uma palavra. Quebras na linguagem pra dar um efeito exclamativo e reflexivo à história.
Pra quem é fã ou pra quem não é, vale a pena conferir a novidade.
Dois trechos abaixo:
"Amor é uma palavra bela, mas inalcançável. Amor é um Himalaia, um Aconcágua. Bom de sonhar quando se está estendida numa rede, roteirizando cenas que nunca serão vividas. Mas prefiro sexo".
"Primeiro casei com um filósofo que não podia me comer, agora vivo com esse homem que me come sem que a gente converse e analise corajosamente o que está acontecendo. No início, eu pensava: entre um e outro, escolho o futuro. Algo que está por vir. Enquanto o futuro não vem, me divirto com esse acidente de percurso. Foi a minha queda, a minha granada: achar que estava apenas me divertindo".
E lá vou eu de novo com ela, grande amor, mas não único. E não é que a editora L&PM Pocket lançou no final de maio um livro de Martha? Sem muito estardalhaço, esse veio quietinho, mas veio intenso, arrebatador. É uma espécie de novela e que se encaixou na 'Coleção 64 páginas' da editora, com preço fixo de R$ 5,00. O título? Sugestivo e veio bem a calhar nesses tempos de insônia coletiva: "Noite em claro".
Se você for um leitor ávido, acho que dá pra ler em uns 15 ou 20 minutinhos. O texto é rápido, não trava e ainda oferece umas risadas solitárias, principalmente diante de frases inesperadas no meio da narrativa. Nesta obra, Martha insere uma ousadia: em uma página, conta a história que ocupa apenas metade da folha; em outra página, apenas uma frase ou uma palavra. Quebras na linguagem pra dar um efeito exclamativo e reflexivo à história.
Pra quem é fã ou pra quem não é, vale a pena conferir a novidade.
Dois trechos abaixo:
"Amor é uma palavra bela, mas inalcançável. Amor é um Himalaia, um Aconcágua. Bom de sonhar quando se está estendida numa rede, roteirizando cenas que nunca serão vividas. Mas prefiro sexo".
"Primeiro casei com um filósofo que não podia me comer, agora vivo com esse homem que me come sem que a gente converse e analise corajosamente o que está acontecendo. No início, eu pensava: entre um e outro, escolho o futuro. Algo que está por vir. Enquanto o futuro não vem, me divirto com esse acidente de percurso. Foi a minha queda, a minha granada: achar que estava apenas me divertindo".
domingo, 3 de junho de 2012
Gravado na parede de Drummond
Boa noite, pessoal. Digitei pra vocês um poema de Drummond que nunca foi publicado em livro. Assim como este, outros 24 poemas inéditos foram encontrados em seus arquivos. A Revista Bravo! deste mês traz alguns poemas e conta que agora a editora Cosac Naify vai publicar a obra.
Segue abaixo:
Gravado na parede
Saber que tu não virás nunca encher de rosas o meu quarto,
encher de beleza a minha vida...
e continuar à espera, de mãos vazias...
Saber que não partirás o meu pão, que não beberemos juntos,
ao jantar, um pouco d'aquele amável grato vinho velho,
que não acenderás a minha lâmpada,
que o piano não possuirá os teus dedos...
Saber tudo isso, o impossível e o irremediável
de tudo isso... e continuar sonhando inutilmente.
Ah! Por que não virás encher de rosas o meu quarto?
Ao menos, vem encher-me de lágrimas os olhos.
(Carlos Drummond de Andrade)
Segue abaixo:
Gravado na parede
Saber que tu não virás nunca encher de rosas o meu quarto,
encher de beleza a minha vida...
e continuar à espera, de mãos vazias...
Saber que não partirás o meu pão, que não beberemos juntos,
ao jantar, um pouco d'aquele amável grato vinho velho,
que não acenderás a minha lâmpada,
que o piano não possuirá os teus dedos...
Saber tudo isso, o impossível e o irremediável
de tudo isso... e continuar sonhando inutilmente.
Ah! Por que não virás encher de rosas o meu quarto?
Ao menos, vem encher-me de lágrimas os olhos.
(Carlos Drummond de Andrade)
sexta-feira, 1 de junho de 2012
Uma curiosidade...
Clicando ali, clicando acolá... encontro uma letrinha fora do lugar.
Cruz e Sousa, nosso famoso simbolista brasileiro, está "enZeado" na parede. O correto é com "S".
E isso é apenas uma observação. :-)
Cruz e Sousa, nosso famoso simbolista brasileiro, está "enZeado" na parede. O correto é com "S".
E isso é apenas uma observação. :-)
Dantas e Dal Farra lançam novas obras em noite de autógrafos na Saraiva
Na noite da última quinta-feira, 31, aconteceu o lançamento dos livros do escritor Francisco Dantas e da poeta Maria Lúcia Dal Farra, na Livraria Saraiva, no Shopping Riomar. Durante o lançamento, uma noite de autógrafos proporcionou a Dantas e a Dal Farra uma maior aproximação com o púbico.
O escritor Francisco Dantas lançou o romance 'Caderno de Ruminações', pela editora Alfaguara. Escritor e professor da Universidade Federal de Sergipe, Dantas participará da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) este ano em julho. O evento é considerado um dos maiores festivais literários da América Latina.
A poeta Maria Lúcia publicou, pela editora Iluminuras, o livro de poemas 'Alumbramentos'. Além desse, mais dois que organizou com material da poeta portuguesa Florbela Espanca, 'Afinado Desconcerto' e 'Sempre Tua'.
Maria Lúcia é crítica literária, professora de Literatura Portuguesa e pró-reitora de pós-graduação da Universidade Federal de Sergipe, além de ser grande estudiosa da vida e obra de Florbela Espanca.
Fotos: Lara Aguiar
domingo, 15 de abril de 2012
Bagunça
Aridez de pensamentos.
Secura de luz.
Garganta ressecada.
A pedra descendo na goela,
o mundo com gosto de bife de fígado
e o vento entrando torto
por entre as vielas do corpo.
Um braço habita a falta de coragem
e sai pela boca,
contorcendo mão e dedos,
num bailar de fogo pedindo pra ser abanado.
É um calor que arrepia as vontades,
cospe brasa no chão
e cede lugar ao aperto.
Sufoca,
grita,
agita,
aumenta a quentura da agonia.
A cintura afina,
o batom gruda,
o cabelo embaraça.
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